Cinco dias antes de morrer, Renato Russo, vocalista e autor de todas as canções da Legião Urbana, atendeu o telefone e disse: “Estou mal e não posso mais nem falar”.
Diagnosticado com Aids, o cantor estava cada vez mais debilitado e não resistiu a complicações pulmonares e renais causadas pela doença. Ele faleceu em casa, à 1h15 da madrugada de 11 de outubro de 1996, aos 36 anos.
O relato da ligação divulgado pela revista ‘Veja’, que descreveu como o cantor respondeu ao ator e amigo Marcelo Berê, que tinha feito a chamada para saber como ele estava. A precoce morte de Renato Russo foi noticiada como a de um “rebelde”, que “com versos e rock nomeou a sujeira e o vazio de sua época”.
Renato Russo: portador do HIV, vítima da Aids
Voz inconfundível da Legião Urbana, Renato Russo soube em 1990 que era soropositivo (portador do vírus HIV, o causador da Aids), após o breve relacionamento com o norte-americano Robert Scott Hickmon, que ele conheceu em Nova York e chegou a morar junto no Brasil.
Segundo amigos, o fundador da Legião Urbana sabia que o ex-namorado de Scott estava morrendo devido à Aids. “Foi fogo. O namorado do Scott estava em estado terminal de Aids e mesmo assim o Renato Russo se envolveu com ele”, relembrou Leonice de Araújo Coimbra, a Léo, que testemunhou o início do relacionamento, em entrevista à revista ‘Isto É Gente’, em março de 2000.
Léo ainda diz que Renato Russo tinha certeza de que tinha pegado o vírus de Scott, que, segundo ela, “foi embora e ninguém soube mais dele”. Abalado com o resultado do exame, o cantor decidiu manter a informação em segredo dos familiares.
Nem mesmo a mãe de Renato Russo, conhecida como dona Carminha, sabia que o filho havia sido diagnosticado com a doença e só descobriu a verdadeira causa da morte por meio do noticiário na TV.
“À noite, ouvi na tevê: ‘Morreu hoje de Aids o cantor Renato Russo’. Foi um choque. De manhã, declarei que meu filho tinha morrido de anorexia nervosa”, relembrou Dona Carminha, em entrevista à mesma edição da ‘Isto É Gente’.
A magreza do filho era causada pelo transtorno alimentar, que fez parte de um processo de depressão profunda, que acometeu o cantor após a confirmação do diagnóstico de Aids.
A depressão e os últimos dias de Renato Russo
Em janeiro daquele ano, Renato Russo chegou a dizer a amigos, de acordo com a ‘Veja’, que se imaginava chegando aos 50 anos e escrevendo o livro dele. Em julho, o cantor anunciou que queria descansar após terminar de gravar ‘A Tempestade’.
Três meses antes de morrer, ele tinha se isolado do mundo e se trancado no apartamento em Ipanema, no Rio de Janeiro. Foi então que ele passou a se recusar a comer, andar e até a falar.
Dois meses antes daquele 11 de outubro, o ‘Trovador Solitário’ teria dito: “A morte está perto e quero aproveitar ao máximo este momento para aprender com a própria vida e com a morte”. Um mês antes, ele descreveu como se sentia ao tomar o coquetel anti-HIV: “É como se tivesse comendo um cachorro vivo. E o cachorro me come por dentro”.
Três dias antes da morte, um boato: Renato Russo teria tirado a própria vida. A hipótese assustou Dado Villa-Lobos, guitarrista na Legião Urbana, que correu até o apartamento do cantor para ver se estava tudo bem – dentro do possível.
Sem comer, Renato Russo mal conseguia andar e apenas chorou abraçado a Dado, segundo Fernanda Villa-Lobos contou em entrevista ao jornal ‘Folha de S. Paulo’, no dia seguinte à morte do cantor. “Os dois choraram muito tempo abraçados. Dado ficou arrasado. Ele não sabia como ajudar o amigo”, explicou ela.
O fim e a briga pela Legião Urbana
Dez dias depois da morte de Renato Russo, Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá anunciaram o fim da Legião Urbana. Nove meses depois, o oitavo e último álbum da banda – e o primeiro póstumo com o cantor – foi lançado.
‘Uma Outra Estação’ contava com faixas gravadas durante as sessões para ‘A Tempestade’, que deveriam fazer parte do álbum, mas acabaram ficando de fora devido a decisões comerciais.
A Legião Urbana entrou para a história do rock brasileiro como uma das grandes bandas e se mantém viva também para além da cena musical: no campo judicial.
A disputa jurídica pela marca Legião Urbana se deu entre a empresa Legião Urbana Produções Artísticas, de propriedade do filho único de Renato, Giuliano Manfredini, e os dois integrantes, Dado e Bonfá.
Eles saíram em turnê em 2015 com o projeto Legião Urbana XXX Anos e, depois, passaram a fazer shows com o repertório dos discos ‘Dois’ e ‘Que País É Este?’.
Após idas e vindas, a Justiça decidiu, em novembro de 2018, que os dois poderão usar o nome em turnês, mas deverão pagar à produtora um terço do que faturarem.
Ainda cabe recurso e a decisão sobre a marca Legião Urbana está pendente para ser analisada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Enquanto isso, o legado musical de Renato Russo mantém a Legião Urbana lembrada e ouvida entre os brasileiros – vide números do Spotify, que, em janeiro de 2019, apontavam 2,6 milhões de ouvintes mensais.
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