Fotos: Divulgação Clara Nunes

Após 40 anos, médico quebra silêncio sobre a morte de Clara Nunes: ‘nunca vi aquilo’

A morte de Clara Nunes, uma das maiores cantoras do Brasil, completou 40 anos.

O médico que operava as varizes da cantora quando ela sofreu complicações que acarretaram em sua morte falou pela primeira vez, ao ‘Fantástico’, sobre o que aconteceu naquela sala de cirurgia que acabou colocando fim à vida dela tão precocemente – Clara Francisca Gonçalves Pinheiro tinha apenas 40 anos de idade.

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“Ela teve uma reação absolutamente desproporcional. Nunca mais vi na vida”, explicou o cirurgião vascular Antônio Vieira de Melo ao dominical da TV Globo.

Clara Nunes foi operar varizes, um procedimento médico realizado para tratar veias varicosas, que são veias dilatadas, tortuosas e inchadas, geralmente nas pernas. As varizes podem causar dor, desconforto e problemas estéticos para quem as possui.

A cirurgia visa eliminar ou diminuir essas veias, experimentar a circulação sanguínea e a aparência das pernas. Existem diferentes técnicas cirúrgicas, como a remoção das veias (flebectomia), a ablação por laser ou radiofrequência e escleroterapia, que variam de acordo com a gravidade.

Em 1983, é claro, a técnica da cirurgia era menos tecnológica. O procedimento, normalmente, era feito com anestesia local e sedação simples.

“Quando eu cheguei no hospital, ela estava brigando com o anestesista porque ele estava insistindo para não colocar tubo na garganta dela. Ela queria dormir, queria anestesia geral“, relatou o médico.

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Segundo ele, o anestesista Américo Salgueiro aplicou a anestesia geral em Clara Nunes e, no fim da operação, o cirurgião vascular percebeu algo estranho com a paciente.

“O sangue dela estava um pouco escuro. Naquela época nós não tínhamos a monitorização que nós temos hoje. Ela estava com taquicardia, frequência muito rápida, a ponto de ter uma parada cardíaca… Cheguei a fazer injeção intracardíaca de adrenalina. Ela voltou“, contou o cirurgião.

O ‘Fantástico’ teve acesso à Sindicância do Conselho Regional de Medicina que, com 865 páginas, traz relatos de profissionais que participaram da operação. Eles foram unânimes em afirmar que os médicos não se ausentaram e que os equipamentos não falharam. Ou seja, não houve erro médico.

Acontece que a família de Clara Nunes não denunciou o caso e não autorizou a autópsia no corpo da cantora. O fato é que ela teve um choque anafilático, o corpo dela reagiu à anestesia geral.

Ela teve um grande edema no cérebro e entrou em coma, permanecendo assim por 28 dias na Clínica São Vicente, no Rio de Janeiro, até morrer.

“Estou com 58 anos de formado, nunca vi aquilo. Medicina… A gente não tem uma ciência exata igual a matemática. Cada ser humano reage de um jeito, relatou o médico.

Médico - Clara Nunes

Foto: Reprodução/TV Globo

“Se vocês querem saber que eu sou. Eu sou a tal mineira. Filha de Angola, de Ketu e Nagô. Não sou de brincadeira. Canto pelos sete cantos, não temo quebrantos porque eu sou guerreira“. 

Estes são os versos iniciais da música Guerreira, que definem quem foi Clara Nunes. Uma mulher que falou de liberdade e lutou contra o racismo religioso em uma época que o tema quase não era comentado.

Clara parecia estar à frente do seu tempo. Talvez por este motivo, 40 anos depois da morte da cantora, suas músicas continuam atuais e servem de inspiração para artistas que fazem releituras do seu trabalho.

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A cantora Fabiana Cozza é uma delas. No disco ‘Canto Sagrado’, ela regravou músicas de Clara em um trabalho que se transformou em homenagem.

“Este disco faz parte do meu desejo de fazer um trabalho para exaltar Clara Nunes. Eu acho que ela é um símbolo da brasilidade. Um exemplo para todos que desejam conhecer a música e o Brasil”, diz.

No ‘Fantástico’ deste domingo (2), a cantora Alcione cantou algumas músicas de Clara Nunes na homenagem preparada pela emissora global.

Durante o programa, a Marrom disse: “Eu sabia que ela era uma pessoa que podia ser minha amiga porque ela tinha o mesmo feeling, pensamento, era uma pessoa família, uma pessoa boa…”. 

Assista à matéria completa do ‘Fantástico’ sobre os 40 anos da morte de Clara Nunes:

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Trajetória de Clara Nunes

Clara Nunes nasceu no interior de Minas Gerais. Ela teve uma infância humilde e começou a cantar no coro da Igreja. Logo, o talento da menina chamou a atenção e Clara ganhou seu primeiro concurso de canto na cidade onde morava, a pequena Cedro, que hoje em dia se chama Caetanópolis.

A carreira musical ganhou impulso depois que Clara se mudou para Belo Horizonte. Ela foi convidada para se apresentar em rádios locais, mas na época cantava boleros e músicas românticas.

Em pouco tempo, a voz potente com um tom diferenciado conquistou os mineiros e Clara recebeu o título de melhor cantora de Minas Gerais, de acordo com informações da ‘Agência Brasil’.

O caminho para o sucesso se concretizou quando ela se mudou para o Rio de Janeiro. Na cidade, olhou o mar pela primeira vez e ficou encantada. Uma paixão que se transformou em inspiração para diversas músicas ao longo da carreira.

A mudança para o Rio também colocou Clara em contato com o mundo do samba. Os ritmos africanos fascinaram a mineira, que deixou o bolero de lado e passou a cantar samba.

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A aproximação de Clara com o som dos tambores africanos também trouxe mudanças na vida religiosa da artista. Ela passou a frequentar terreiros de umbanda e de candomblé e se converteu às religiões de origem africana.

Filha de Ogum com Yansã, levou para os palcos músicas que exaltavam deuses das religiões africanas e as tradições quilombolas.

Silvia Brugger, conselheira do Instituto Clara Nunes, diz que a cantora rompeu barreiras e usou a música para lutar contra a intolerância religiosa.

“O Pai Edu, que foi um dos Pais de Santo de Clara, dizia que ela era uma Mãe de Santo nos palcos. Ela divulgou a cultura negra e afirmou a sua identidade religiosa”, conta.

No Rio de Janeiro, Clara frequentava o terreiro de Vovó Maria Joana, onde às vezes ficava vários dias. Dely Monteiro, neta da líder religiosa diz que Clara buscava sempre a proteção dos orixás e tinha uma relação de muito carinho com Vovó Maria Joana.

“Ela chegava em busca de proteção espiritual e tinha uma relação muito próxima com a minha avó. Clara fazia as suas obrigações e depois ficava aqui em casa e passava várias horas conversando com a minha avó”, relembra.

Ao longo da carreira, Clara Nunes conquistou diversos prêmios musicais. Ela foi a primeira mulher que vendeu mais de 100 mil discos.

Silvia Brugger diz que a artista rompeu barreiras em termos de vendagens na indústria fonográfica. “Para se ter uma ideia o LP dela de 74 foi lançado com 400 mil cópias vendidas. Um número inédito para aquela época”.

Portelense de coração, foi homenageada dando nome à rua onde fica a quadra da escola em Madureira.

A vida de Clara Nunes é contada no musical ‘Deixa Clarear’, que está em cartaz há dez anos. Nos palcos, a atriz Clara Santhana interpreta a história de uma guerreira que sempre lutou para quebrar preconceitos.

“Eu mergulhei na vida da Clara porque era muito necessário contar a história desta mulher. A Clara Nunes é uma figura que não pode ser esquecida pela sua importância na construção da música brasileira e na valorização da cultura africana e indígena”, argumenta à ‘Agência Brasil’.

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Clara Nunes - Cantora

Foto: Divulgação

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