Foto: Divulgação beatles

Apple Rooftop Concert: o último show dos Beatles, num telhado em Londres

Os Beatles já estavam cansados de serem os Beatles quando subiram a um “palco” pela última vez: no dia 30 de janeiro de 1969, os Fab Four pegaram seus instrumentos no topo do edifício do número 3 da Savile Row, no bairro de Mayfair, em Londres, e tocaram para nunca mais tocarem juntos em frente a uma audiência — o último show dos Beatles.

Em 10 de abril de 1970, o público recebia a triste notícia de que o sonho havia acabado: em uma entrevista, Paul McCartney confirmava o rompimento da banda.

A história ainda não definiu com certeza de quem foi a ideia do tal show: há quem diga que foi do conciliador Ringo Starr, e na lembrança do tecladista Billy Preston, que acompanhou o quarteto na apresentação, a ideia foi de John Lennon.

O engenheiro de som Glyn Johnson, célebre por gravar os maiores atos do rock inglês naquele ano (além dos Beatles, Rolling Stones e Led Zeppelin), porém, diz que foi dele.

Fato é que a banda e toda sua laia estavam instalados no prédio da Apple Records, o centro de operações da gravadora, produtora de filmes e estúdio. O plano era — depois de ter gravado e lançado o ‘White Album’ em 1968, e de um período em que Ringo ficou afastado da banda — fazer um filme sobre o processo criativo dos Beatles no estúdio, nas gravações do que seria o disco ‘Let It Be’.

O finale seria uma apresentação ao vivo: a primeira desde o último show da banda, em San Francisco, Califórnia, em 1966.

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As filmagens na verdade começaram no Twickenham Film Studios, e eram realizadas de segunda a sexta começando às 9h da manhã, por regulamentações sindicais. Mas a banda já não estava em seu melhor momento no quesito convivência, e o fato de tentar fazer rock and roll no inverno britânico muito cedo não ajudava.

Tensões entre os Beatles

Um trecho do filme ‘Let It Be’, dirigido por Michael Lindsay-Hogg (que décadas depois revelaria ser filho de Orson Welles) e vencedor de um Oscar de trilha sonora em 1971, mostra um momento em que George Harrison discute com Paul McCartney num tom altamente irônico.

“Eu vou tocar o que você quiser que eu toque ou não vou fazer nada”, diz Harrison. “O que quer que te agrade, eu vou faze”.

Envolvido nas gravações de uma parte das ‘The Basement Tapes’, com Bob Dylan e a The Band em Nova York, Harrison concordou em retornar a Londres sob uma condição: abandonar as sessões no Twickenham e mover a operação para o prédio da Apple Records.

A turma concordou, equipamentos foram levados do estúdio em Abbey Road, e alguns dias depois dos trabalhos o quarteto decidiu estar pronto para o show ao vivo.

Em um momento revelador do filme ‘Let It Be’, McCartney tenta de todo jeito convencer John Lennon e fazer a banda voltar ao palco, usando como argumento a série de shows realizados em Liverpool em 1961, depois da temporada na Alemanha.

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“Quando voltamos, os shows foram terríveis, estávamos nervosos. Mas continuamos a tocar e então a gente tinha eles nas mãos. Se alguém tivesse filmado aquelas apresentações… elas foram fantásticas”, diz Paul.

A sugestão de um show surpresa, inesperado, insólito, é tentadora demais mesmo para John.

Ideias, montagem e show

A história segue e conta que, depois de algumas especulações megalomaníacas como Los Angeles, o Coliseu e uma ilha na Grécia, a banda concordou em fazer subir os equipamentos e tocar no terraço, na hora do almoço, na região central de Londres.

Instrumentos, a estrutura de palco, o sistema de PAs, microfones e cabos foram levados quatro lances de escada acima, e no dia 30 de janeiro de 1969 uma pequena turma de amigos, além da equipe de filmagem, começava a presenciar aquela que seria a última aparição dos quatro Beatles juntos tocando suas músicas.

A missão de montagem e mixagem do som ficou por conta dos engenheiros Glyn Johns, Keith Slaughter e Dave Harries. Um dos problemas a serem resolvidos pela equipe era o vento nos microfones. Eles então mandaram um operador de fitas novato (ninguém menos que Alan Parsons) ir comprar meias-calças numa loja próxima. “Eu recebi muitos olhares estranhos”, lembrou Parsons anos depois.

O som foi mixado numa máquina de gravação de 8 canais, e o grupo performou algumas tomadas de cinco canções: ‘Get Back‘, ‘Dig a Pony‘, ‘I’ve Got a Feeling‘, ‘Don’t Let Me Down‘ e ‘One After 909‘.

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O show durou pouco mais de 40 minutos e foi interrompido, sim, pela polícia, após reclamações de comerciantes e moradores ao redor em relação a barulho e ao aumento do tráfego — transeuntes desavisados são os primeiros a testemunhar a movimentação estranha no teto do prédio, mas é curioso perceber como a notícia se espalha rápido numa era em que telefones celulares eram itens de distopias futuristas.

A história se repete

Em 2009, Paul McCartney repetiu uma experiência semelhante ao tocar de surpresa no teto do Ed Sullivan Theater, em Manhattan, para um quadro especial do Late Show, na época comandado por David Letterman: a notícia se espalhou rapidamente pelo Twitter e milhares de fãs se juntaram nas ruas e nos prédios vizinhos para assistir à performance, 40 anos depois do “show no teto” original.

Em uma entrevista na revista ‘Word’ décadas depois daquela última performance com a banda, McCartney diz: “Eu amei porque ela mostra o que os Beatles eram por baixo de tudo aquilo. Nós éramos uma bela de uma banda”.

No fim do show, após uma versão crua de ‘Get Back’, é possível ouvir Lennon dizer: “I’d like to say ‘thank you’ on behalf of the group and ourselves, and I hope we passed the audition” (“gostaria de agradecer em nome do grupo e de nós mesmos, e espero que tenhamos passado no teste”).

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